Conheça a história do tropeirismo no Brasil
Quando as estradas de ferro ainda eram sonhos de consumo em uma realidade rural marcada por uma topografia de muitas serras, vales e montanhas, foi em cima do lombo de mulas que os tropeiros construíram o início do desenvolvimento da economia brasileira. Por volta do século XVII, começaram as primeiras viagens cortando vários estados, principalmente nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste.
Nas longas viagens, além de escoarem a produção de ouro rumo ao porto de Paraty, no Rio de Janeiro, com destino à Europa, os tropeiros também transportavam alimentos para abastecer não só os pequenos povoados da época, como também as minas onde os garimpeiros estavam proibidos de plantar ou criar gado, em circunstância de uma determinação do Império. O motivo? Não tirar o foco de quem estava trabalhando muitos metros abaixo do solo, além de mantê-los em regime de escravidão.
E foi nesse Brasil colonial que a história do tropeirismo começou a ser escrita. Ou melhor, onde deixou suas marcas cravadas na terra por caminhos que hoje são contemplados por muitos viajantes apaixonados por aventuras, como no Circuito do Ouro.
Nesse post, vamos contar um pouco sobre o tropeirismo, que deixou imensas raízes culturais, gastronômicas, econômicas e políticas em nossa realidade.
Rumo ao desconhecido
As mulas, fruto do cruzamento do burro com a égua, foram os principais animais utilizados pelos tropeiros nas longas viagens, muitas sem o prévio conhecimento do caminho que seria percorrido. Seguindo algumas trilhas abertas pelos índios, muitas caravanas tinham que desbravar novas rotas, abrindo espaço para o surgimento dos primeiros povoados já por volta do século 18.
Foi o que aconteceu com a cidade mineira de Congonhas, formada graças à influência do tropeirismo. Pelo fato de ser situado bem distante do litoral, além da existência de muitas serras, o estado de Minas Gerais acabou dependendo em grande escala do sistema de transporte criado pelos tropeiros. Os animais de carga acabaram se transformando em um dos principais mercados do período. Por conta disso, as mulas chegavam a custar até 40 vezes mais do que uma vaca.
Haja disposição
E a viagem não começava somente quando os animais já estavam carregados. Como na época as mulas só eram criadas no Rio Grande do Sul, trazidas ilegalmente do Uruguai, muitos tropeiros precisavam andar milhares de quilômetros somente para buscar os animais. Viagens cansativas que formaram várias gerações, seja na fundação de vilas, na abertura de estradas ou na inauguração de feiras comerciais.
Afinal, ser tropeiro era uma herança familiar. Frequentemente, os filhos homens já caíam trilhas adentro por volta dos 10 anos de idade, enfrentando logo cedo os percalços das matas, situações adversas por conta do tempo, saqueadores, cobranças de impostos abusivas e perdas de animais.
Inicialmente, o caminho velho do Rio de Janeiro demandava dois meses para que as tropas chegassem até Minas Gerais ou vice e versa. Ele era feito via Vale do Camanducaia, passando por Mogi Mirim-SP e Garganta do Embu. Depois de aberto o caminho novo, a viagem caiu para cerca de 17 dias, tempo que variava de acordo com as intempéries do clima.
Entre os registros históricos, a tropa com o maior número de mulas citada pelo historiador Sérgio Buarque de Holanda foi em 1754. Naquele ano, 3.780 mulas saíram do Rio Grande do Sul rumo a Minas Gerais.
Culinária típica
Muito além de desbravar novas terras, levando riquezas e desenvolvimento, como no surgimento dos alojamentos, os tropeiros foram os criadores de receitas que até hoje dominam a gastronomia típica rural,principalmente mineira. Como trabalhavam arduamente, percorrendo uma média de 40 km por dia, sete dias por semana, por longas semanas, a base da alimentação era composta por muita gordura.
A energia dos tropeiros vinha do feijão, toucinho, torresmo, carne seca, fubá, farinha de mandioca e de milho, além de paçoca. O café forte logo de manhã era sagrado assim como um gole de cachaça, também utilizada para limpar ferimentos ou para aliviar picadas de insetos.
Da herança cultural dos tropeiros, a culinária caipira continua conquistando paladares Brasil afora. Inclusive, um dos pratos característicos que atraem muitos turistas aos restaurantes mineiros, leva o nome destes bravos homens: o feijão tropeiro. E muitas receitas continuam sendo as prediletas em diversas localidades, como o famoso torresminho para acompanhar uma cerveja bem gelada!
Traias no figurino
Ser tropeiro também era sinônimo de andar com um figurino totalmente autêntico. Como tinha de resolver muitos problemas ao longo das viagens, levava consigo muitas ferramentas, além das famosas traias no lombo das mulas, o conjunto da montaria.
A maioria usava chapéu de feltro marrom ou cinza, com uma camisa da mesma cor, bem resistente. Uma capa nos ombros protegia do frio e chuva, sem falar nas longas botas de couro que chegavam a atingir a altura das coxas como proteção em áreas alagadas.
Como precisava ser multifacetado, de soldado a negociador, passando por caçador a artesão, os tropeiros também utilizavam múltiplos instrumentos, como o freme, muito parecido com um canivete suíço; o pito, um instrumento de ferro utilizado na época para apertar o focinho dos animais quando ficavam inquietos na hora de ferrar; o holofote, uma lanterna feita de bambu, entre outros.
Além de tudo isto, a linguagem no meio rural também herdou muitas expressões oriundas dos tropeiros. “Apear”, que significa “descer”, é uma delas. Assim como “arranchar” ou “pousar no rancho”, e “bruaca”, a bolsa de couro que era usada para transportar comida e outras mercadorias. A tradicional cangalha não poderia ficar de fora: trata-se do conjunto de peças de madeira e couro colocadas no lombo das mulas para acomodar os produtos transportados à época.
História do Tropeirismo
Mesmo passando mais de três séculos desde o surgimento das primeiras tropas, a história do tropeirismo é mantida viva na herança cultural mineira. E por algumas cidades que compõem o Circuito do Ouro, como Nova Era e Ipoema – distrito de Itabira, as características são ainda mais evidentes no hábito do povo que vive no meio rural.
Basta fazer um passeio pelo roteiro Entre Ruralidades e Personalidades para observar um pouco da influência dos tropeiros em nossos hábitos diários!
E o ciclo do ouro traz experiências que vão bem além da cultura tropeira. É o caso dos grandes artistas barrocos. Conheça um pouco da história de cada um deles no artigo sobre a arte dos mestres do Barroco.
Adorei!Essas informações foram muito úteis e eu agradeço pois tirei 10 no trabalho de história muito obrigada mesmo.
Oi Ana Beatriz! Que bom! Ficamos muito felizes em poder ajudar. Parabéns e continue assim. E se precisar, pode contar com a gente! Abraços!
Muito interessante a pesquisa.serviu para material de escola